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Lula 100% político

Fonte: jornal O POVO

ARTIGO 18/05/2014

Lula 100% político


André Haguette
haguette@superig.com.br
Sociólogo e professor da UFC

Vi o título deste artigo na manchete de um jornal, título que me pareceu uma excelente definição do ex-presidente Lula hoje em dia. Lula ocupa um lugar de destaque na vida e política brasileira desde o final dos anos 70 do século passado, quando, dirigente sindical, iniciou o que foi chamado de “sindicalismo de resultado”, passou a lutar pelo fim da ditadura, criou o partido dos trabalhadores e candidatou-se à presidência da República. Naquele momento, cientistas sociais e grande parte da imprensa política descreviam-no como um líder carismático, isto é, como um líder que, por possuir um dom interior ímpar, atraí seguidores e, portanto, renova e abre caminhos. Parece-me que o epiteto carismático para definir Lula está sendo gradativamente substituído pelo adjetivo pragmático, destacando a habilidade política de Lula e não mais uma áurea pessoal que pressiona a adesão das pessoas. 

Cada vez mais Lula passa a ser descrito como possuidor de uma intuição política, esta sim, ímpar que o faz ser, agir e pensar de acordo com as circunstâncias, guiado pela busca do poder pelo poder, como quase todos os políticos. Enfim, Lula 100% político.

Essa nova percepção torna Lula mais vulnerável, menos distinto e distinguível entre outros chefes políticos. Lula passa a ser visto não como uma grande liderança capaz de indicar novos caminhos, fazer grandes mudanças e levar o eleitorado ao paraíso, mas como chefe de um partido que quer se manter no poder a todo custo, compartilhando, portanto, a ambição de todos os partidos: conquistar e manter-se no poder para seu benefício e glória.

É possível que no passado tivesse havido uma idealização do líder nascente e certa idolatria de atos não tão raros interpretados como proezas. Afinal de conta, quem vai negar a importância do chefe sindical e criador do PT na derrubada no regime militar? Mas, em contrapartida, como, possuído por tamanho carisma, um líder chega a perder três eleições seguidas? Não terá sido vitoriosa a quinta campanha eleitoral, não tanto por um dom inexplicável, mas pela outorga do oportuno e positivo Bolsa Família? O epiteto “pragmático” passou a qualificar Lula quando os mesmos cientistas sociais e jornalistas perceberam que ele se colocava acima do PT e passava a fabricar uma nova variante política, o lulismo, que implica numa “realpolitics”, num “pacto conservador”, segundo André Singer.

Os princípios e os discursos de Lula veem mudando. “Os trezentos picaretas do Congresso” passaram a ser aliados e a ocupar ministérios e cargos nas mesas do parlamento. O socialista petista, que foi obrigado a tornar pública uma Carta ao Povo Brasileiro para se eleger, passou a declarar que nunca fora socialista. De arauto da ética com o PT passou a defender os aloprados e a fazer pouco do julgamento do mensalão. 

Lula não para de adaptar seus discursos a novas situações, refugiar-se no silêncio quando melhor lhe convier, criticar ou defender a política econômica de Dilma, desvencilhar-se de amigos ou fazer novas amizades. Talvez o brasileiro esteja a descobrir que o carisma de Lula consiste em ser político 100% de acordo com a velha cultura política brasileira.

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