O POVO- Jornal
de Hoje
OPINIÃO- ARTIGO
06/01/2013
Desafios
e problemas de hoje
"Vivemos num mundo em que
episte-mologica-mente se tem cada vez menos certezas"
É comum na passagem de um ano a outro que as
pessoas se perguntem onde estamos, para onde vamos no novo ano. O sociólogo
português Boaventura de Sousa Santos tem ajudado em seus escritos e
conferências nessa tarefa apontando para as sete grandes ameaças do mundo de
hoje:
1)A
desconsolidação da democracia: esvazia-se a democracia. Votamos no que é menos
importante na medida em que as grandes decisões não passam mais pelo jogo
democrático. O sonho de uma democracia social está desaparecendo e conquistas
que pareciam irreversíveis mostram-se agora inteiramente vulneráveis: direitos
sociais são sistematicamente eliminados. Parece que só resta a “praça” como o
único espaço público não colonizado pelas instituições vigentes. O que se
reivindica é simplesmente a “democracia real” uma vez que o ideal democrático
que impregna nossas sociedades não foi efetivado. Isso exige novas formas de
militância política;
2) A
desorganização do Estado ou sua reorganização: O Estado de Bem-Estar dos
cidadãos se transformou no Estado de Bem-Estar das empresas e de seus lucros. A
grande mudança foi a do financiamento do Estado: passou-se dos impostos para o
crédito. Fez-se uma guerra violenta à tributação. Nesse contexto entram, então,
os bancos para emprestar crédito aos Estados agora incapazes de cumprir as
exigências do Estado Social. Isso provoca o grande problema do endividamento
que está destruindo a Europa sem guerra;
3) A
destruição da natureza: essa é a fonte da grande crise que toca a humanidade,
porque destrói as próprias fontes da vida. Esse processo tem muitas facetas.
Uma delas é que a terra e a água se transformaram em bens absolutamente
centrais. Daí a nova onda de concentração: há países e empresas, inclusive,
brasileiras, comprando, por exemplo, na África enormes extensões de terra para
estocar;
4)Desvalorização
do trabalho: a afirmação básica é que na fase atual do capitalismo ele perdeu
sua importância a partir da desmaterialização da produção através das ciências
e das novas tecnologias. Na realidade estão renascendo formas de trabalho
semelhantes ao trabalho escravo e a distinção entre trabalho pago e não pago
desapareceu com o novo padrão tecnológico. Grande parte do novo trabalho é
realizado em casa. Quem paga?
5)
Mercantilização do conhecimento: as universidades têm que produzir o
conhecimento que tem valor de mercado. Que lugar têm as humanidades nesse
modelo? Cada vez mais decresce sua importância. Há aqui um novo tipo de tensão:
vivemos num mundo em que epistemologicamente se tem cada vez menos certezas,
mas a mercantilização exige certezas;
6)Criminalização
do movimento social: hoje protestar contra políticas injustas pode ser crime o
que tem marcado a vida de muitos líderes sociais;
7)
Re-colonização das diferenças. A humanidade se tornou una pela planetarização
da civilização técnico-científica. Isso nos levou a conhecermos hoje muito mais
diversidade cultural, a vivermos em sociedades multiculturais, mas colocamos as
diferenças numa hierarquia e discriminamos o que se afasta do padrão. Com tudo isso
é o próprio destino da humanidade que se torna tarefa comum.
Manfredo
Araújo de Oliveira
manfredo.oliveira@uol.com.br
Filósofo
e professor da UFC
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